Muito se discutiu sobre a validade da arbitragem nas relações de franquia, chegando-se a conclusão que a eleição da arbitragem é válida, ainda que se trate de franquia, e se entenda que o contrato de franquia é um contrato de adesão, desde que sejam respeitados os termos do parágrafo 2º do artigo 4º da lei n. 9.307/96. A dúvida sobre a validade do foro de eleição, quando não há eleição da arbitragem, contudo, gerava certa dúvida perante os tribunais, que em certos momentos admitia a eleição, e em outros não a admitiam.
Recente decisão da Terceira Turma do STJ, contudo, dispôs que: “a competência para a ação que visa à reparação de danos, fundada em responsabilidade contratual ou extracontratual deve ser proposta no local onde se produziu o dano não no domicílio do réu. Trata-se, no entanto, de competência territorial relativa que, portanto, pode ser derrogada por contrato, de modo a prevalecer o foro de eleição”. (REsp 930.875/MT, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/06/2011, DJe 17/06/2011)
Esta decisão acrescentou, ainda, que como é “inaplicável o Código de Defesa do Consumidor ao contrato de franquia, não se acolhe a alegação de abusividade da cláusula de eleição de foro ao só argumento de tratar-se de contrato de adesão”.
A aplicação do foro eleito no contrato de franquia foi discutida no julgamento de um recurso especial interposto pela Fusos Comércio e Participações Ltda., detentora dos direitos do uso da marca Shell no Brasil, que celebrou contrato de franquia com a Cuiabá Produtos Automotivos Ltda. para distribuição no varejo de óleos lubrificantes, graxas e outros produtos do gênero, tendo o contrato de franquia elegido o foro do Rio de Janeiro (RJ) para resolver problemas jurídicos decorrentes do negócio.
No caso em questão, o Tribunal de Justiça do Mato Grosso (tribunal de origem) não tinha reconhecido o foro eleito no contrato de franquia, tendo o recorrente alegado infração a Súmula 335/STF, nos termos da qual “É válida a cláusula de eleição do foro para os processos oriundos do contrato”.
O tribunal de origem não chegou a se manifestar sobre a natureza do contrato de franquia, e também não afirmou que a cláusula que estabeleceu o foro de eleição era nula por se tratar de um contrato de adesão. Pelo contrário, deixou estabelecido ser ela válida, só não lhe reconhecendo efeitos, por entender que teria prevalência a regra do artigo 100, V, “a”, do Código de Processo Civil, sobre a do artigo 111 do mesmo diploma.
Em sua decisão, os ministros do STJ dispuseram que a abusividade da cláusula de eleição do foro, no contrato de franquia, não decorre do simples fato de se celebrar por contrato de adesão, mas apenas se ficar caracterizado:
– da hipossuficiência do franqueado acarretar falta de intelecção suficiente para a cláusula;
– de subjugação do franqueado, no momento da celebração do contrato, dada a disparidade de forças entre os contratantes;
– de impossibilidade do direito de defesa do franqueado no foro eleito, dada a disparidade de forças.
Acrescentaram ainda os dizeres do relator ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira: “Somente não subsiste a competência do foro contratualmente eleito, mesmo que o tenha sido em sede de contrato de adesão, se evidenciado que um dos contratantes, no momento da celebração, não dispunha de intelecção suficiente para compreender o sentido e consequências da estipulação contratual, ou ainda, quando de tal estipulação resulte inviabilidade ou especial dificuldade de acesso econômico, retirando-lhe, na prática, a possibilidade de exigir coercitivamente o cumprimento das obrigações ajustadas ou de promover a satisfatoria defesa dos seus interesses em juízo”. (REsp 46544/RS, Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, DJ 10.5.1994)
Afirmaram, ainda, no acórdão, que como o tribunal de origem não indicou tratar-se das hipóteses de excepcionamento da validade da cláusula do foro de eleição no contrato de adesão. Limitando-se a invocar o fato de tratar-se de contrato de adesão, o que é insuficiente para tornar abusiva a cláusula de eleição de foro. Por esse motivo, segundo o STJ a competência que ordinariamente se fixaria pelo local do dano, por ser relativa, não poderia prevalecer sobre aquela convencionada pelas partes no contrato de franquia.
Apesar do STJ já ter pacificado entendimento no sentido de que não se aplica o Código de Defesa do Consumidor nas relações havida entre Franqueador e franqueado, esta nova decisão, reforça ainda mais estes entendimento. De toda forma, para que o franqueado não seja visto como a parte mais fraca da relação, e ainda, sem intelecção suficiente para analisar o foro eleito, afinal, na maioria das vezes essa não é a realidade, é importante que o franqueador se resguarde de provas da inexistência da hipossuficiência e falta de intelecção por parte do franqueado.
* Marina Nascimbem Bechtejew Richter é sócia do Nascimbem Bechtejew Advogados
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